Prima Julieta
Murilo Mendes
Prima Julieta, jovem viúva, aparecia de vez em quando na casa de meus pais ou na de minhas tias. O marido, que lhe deixara uma fortuna substancial, pertencia ao ramo rico da família Monteiro de Barros. Nós éramos do ramo pobre. Prima Julieta possuía uma casa no Rio e outra em Juiz de Fora. Morava em companhia de uma filha adotiva. E já fora três vezes à Europa.
Prima Julieta irradiava um fascínio singular. Era a feminilidade em pessoa. Quando a conheci, sendo ainda garoto e já sensibilíssimo ao charme feminino, teria ela uns trinta ou trinta e dois anos de idade.
Apenas pelo seu andar percebia-se que era uma deusa, diz Virgílio de outra mulher. Prima Julieta caminhava em ritmo lento, agitando a cabeça para trás, remando os belos braços brancos. A cabeleira loura incluía reflexos metálicos. Ancas poderosas. Os olhos de um verde azulado borboleteavam. A voz rouca e ácida, em dois planos; voz de pessoa da alta sociedade. Uma vez descobri admirado sua nuca, que naquele tempo chamavam de cangote, nome expressivo: pressupõe jugo e domínio. No caso somos nós, homens, a sofrer a canga. Descobri por intuição a beleza do cangote e do pescoço feminino, não querendo com isto dizer que subestimava outras regiões do universo.
Murilo Mendes
Prima Julieta, jovem viúva, aparecia de vez em quando na casa de meus pais ou na de minhas tias. O marido, que lhe deixara uma fortuna substancial, pertencia ao ramo rico da família Monteiro de Barros. Nós éramos do ramo pobre. Prima Julieta possuía uma casa no Rio e outra em Juiz de Fora. Morava em companhia de uma filha adotiva. E já fora três vezes à Europa.
Prima Julieta irradiava um fascínio singular. Era a feminilidade em pessoa. Quando a conheci, sendo ainda garoto e já sensibilíssimo ao charme feminino, teria ela uns trinta ou trinta e dois anos de idade.
Apenas pelo seu andar percebia-se que era uma deusa, diz Virgílio de outra mulher. Prima Julieta caminhava em ritmo lento, agitando a cabeça para trás, remando os belos braços brancos. A cabeleira loura incluía reflexos metálicos. Ancas poderosas. Os olhos de um verde azulado borboleteavam. A voz rouca e ácida, em dois planos; voz de pessoa da alta sociedade. Uma vez descobri admirado sua nuca, que naquele tempo chamavam de cangote, nome expressivo: pressupõe jugo e domínio. No caso somos nós, homens, a sofrer a canga. Descobri por intuição a beleza do cangote e do pescoço feminino, não querendo com isto dizer que subestimava outras regiões do universo.
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